Projeto de lei que restringe o acesso à terra e ameaça a proteção ambiental é aprovado sem consulta civil no Pará
Em 11 de junho de 2019, a Assembléia Legislativa do Estado do Pará (ALEPA) aprovou o projeto de lei estadual 129/2019, após duas votações consecutivas. O projeto restringe o acesso à terra e criminaliza movimentos sociais, ao mesmo tempo em que favorece a grilagem de terras públicas, além de colocar em risco a preservação ambiental no Estado. Seu processo legislativo foi marcado por irregularidades, incluindo a falta de consulta civil. O projeto de lei 129/2019 faz parte de um padrão de violência contra trabalhadores rurais defensores do direito à terra, frequentemente aceito ou conduzido pelas próprias autoridades estaduais. Após análise da Procuradoria Geral do Estado e Procuradores do ITERPA sobre solicitações de vetos apontados por organizações da sociedade civil, o PL aguarda sanção ou rejeição do Governador do estado, Helder Barbalho. Havendo sanções ou vetos parciais o PL retorna à ALEPA para novas deliberações.
O projeto de lei 129/2019 ataca diretamente as ocupações rurais estabelecidas por lideranças e movimentos de defesa dos direitos à terra em terras públicas, apesar da existência de dispositivos legais e constitucionais para salvaguardar seus direitos, como o princípio constitucional da função social da propriedade e a lei da reforma agrária.
Isso é feito permitindo a venda de terras públicas a empresas privadas sem processos de licitação ou estudos de impacto, cobrando até nove vezes menos do que os preços de mercado. Além disso, o projeto de lei estadual 129/2019 também permite a legalização de territórios anteriormente sujeitos a grilagem, favorecendo latifundiários ocupantes ilegais de terras públicas.
O processo de aprovação e o conteúdo do projeto de lei não cumpriram algumas disposições da Constituição Federal e da Constituição do Pará. Mais notavelmente, o processo legislativo não incluiu nenhuma audiência pública com membros da sociedade civil para discutir impactos sociais e ambientais, como exigido de qualquer projeto de lei relacionado a propriedade e justiça socioambiental.
Além disso, o processo de aprovação na Assembléia Legislativa não respeitou os regulamentos internos do órgão, que determinam que os projetos de lei precisam passar por duas discussões e períodos de votação, em dias distintos, mesmo em assuntos urgentes. Como resultado das diversas irregularidades, em 26 de junho de 2019 a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) emitiu uma Nota Técnica ao governador do estado do Pará, Helder Barbalho, solicitando que a lei fosse reavaliada pela Assembléia Legislativa antes de sancionada.
Não é por acaso que esse projeto foi aprovado no estado do Pará, conhecido como o estado mais violento para quem defende o direito à terra no Brasil. Autoridades são frequentemente responsáveis por leis e políticas que desmantelam violentamente os movimentos sociais que pressionam pela reforma agrária, pelo direito à terra, pelos direitos ambientais e pelo acesso à alimentação. De acordo com a Nota Técnica da Procuradoria Federal, esse projeto apresenta a “possibilidade de grandes e irreversíveis danos à estrutura da propriedade no Pará”, e da forma como foi aprovado pela ALEPA, aumentará severamente os já alarmantes níveis de violência rural do estado.
Nas últimas semanas, a Front Line Defenders condenou e chamou a atenção para a série de despejos planejados a ocorrerem de junho a setembro de 2019 no estado do Pará, agravando o já alarmante índice de vulnerabilidade a que estão expostos trabalhadores e trabalhadoras rurais, lideranças locais, movimentos sociais, defensores de direitos humanos e organizações que apoiam processos de redistribuição de terras. A Front Line Defenders acredita que esses despejos, associados a um projeto de lei estadual que favorece grileiros e membros da elite agrária, visam o desmantelamento dos movimentos de direitos à terra e a imposição de restrições ao trabalho dos defensores dos direitos humanos.
A Front Line Defenders manifesta sua preocupação com a aprovação do projeto de lei 129/2019 sem consulta civil e insta as autoridades estaduais a tomarem todas as medidas necessárias para fornecer ampla consulta e diálogo com os membros da sociedade civil antes de sancioná-la. A Front Line Defenders manifesta ainda sua preocupação com a redistribuição de terras e impactos ambientais no Pará em detrimento dos defensores e movimentos de direitos humanos que historicamente lutaram pelo acesso à terra, apesar das garantias do devido processo e dos princípios de justiça social.